terça-feira, 17 de março de 2009

O "Poetinha" Vinícius de Moraes


1 Introdução

Onde Anda Você

E por falar em saudade onde anda você
Onde andam seus olhos que a gente não vê
Onde anda esse corpo
Que me deixou louco de tanto prazer
E por falar em beleza onde anda a canção
Que se ouvia na noite dos bares de então
Onde a gente ficava,onde a gente se amava
Em total solidão
Hoje eu saio da noite vazia
Numa boemia sem razão de ser
Na rotina dos bares,que apesar dos pesares
Me trazem você
E por falar em paixão, em razão de viver
Você bem que podia me aparecer
Nesses mesmos lugares, na noite, nos bares
Onde anda você.

Um dos artistas mais completos de sua época e de todos os tempos, Víníci-us de Moraes já foi tema de inúmeros livros, artigos, estudos que procuraram pre-tensamente discutir e apresentar sua obra. Pretensamente, pois não se discute Vinícius; Vinícius se sente.
Este trabalho, portanto, só traz um breve histórico do maior poeta brasileiro do século XX, na tentativa de mostrar sua vida e obra. Vã tentativa, é verdade, pois a complexidade de sua personalidade só nos deixa a contextualização como forma segura de informação.
A metodologia utilizada difere dos demais trabalhos acadêmicos que tem outros objetos de estudo. Além de pesquisas, suas músicas, poemas e textos foram “degustados” para sentir, mesmo sem noção de como se expressar esse sentimen-to, e descrever – como se isso fosse possível – a criatividade do gênio. E comparti-lhando-os – mesmo que não seja comum em trabalhos acadêmicos – parece ser a melhor forma de mostrar a aura poética que envolve o seu trabalho. Portanto, durante este trabalho acadêmico será lançado esse recurso, apresentando alguns de seus poemas e letras.


2 Vida

Poema Enjoadinho


Filhos... Filhos?
Melhor não tê-los!
Mas se não os temos
Como sabê-lo?
Se não os temos
Que de consulta
Quanto silêncio
Como o queremos!
Banho de mar
Diz que é um porrete...
Cônjuge voa
Transpõe o espaço
Engole água
Fica salgada
Se iodifica
Depois, que boa
Que morenaço
Que a esposa fica!
Resultado: filho.
E então começa
A aporrinhação:
Cocô está branco
Cocô está preto
Bebe amoníaco
Comeu botão.
Filho? Filhos
Melhor não tê-los
Noites de insônia
Cãs prematuras
Prantos convulsos
Meu Deus, salvai-o!
Filhos são o demo
Melhor não tê-los...
Mas se não os temos
Como sabê-los?
Como saber
Que macieza
Nos seus cabelos
Que cheiro morno
Na sua carne
Que gosto doce
Na sua boca!
Chupam gilete
Bebem xampu
Ateiam fogo
No quarteirão
Porém, que coisa
Que coisa louca
Que coisa linda
Que os filhos são!


Vinícius de Moraes, ou Marcus Vinitius da Cruz e Mello Moraes, carioca da gema, nascido em 19 de outubro de 1913, marcou sua vida e carreira como um legí-timo boêmio. O seu maior apego foi pela letra: as músicas que compunha ou os versos que escrevia. Passou por 9 casamentos e teve 5 filhos.
Foi poeta, compositor, jornalista, diplomata, crítico de cinema, intérprete e passou metade de sua vida viajando. Com o AI-5 , foi aposentado da carreira diplo-mática e passou a dedicar-se mais fervorosamente à arte. Suas mulheres oscilavam dos extremos entre vedetes e intelectuais.
Participou do movimento cultural conhecido como “Bossa Nova” com Tom Jobim e João Gilberto, que marcou profundamente a música popular brasileira, ten-do vários parceiros em suas obras, incluindo artistas internacionais. Citação especial para Toquinho, com quem dividiu os palcos com inúmeros sucessos e foi seu último parceiro.
O “poetinha”, como era conhecido, teve todos os traços dos romancistas do século XIX, com exceção do “mal do século”, que levava à ruína prematuramente a vida dos poetas; ao contrário, faleceu em 9 de julho de 1980, aos 66 anos. Quebrou convenções sociais ao aparecer em público cantando com um copo na mão, durante entrevistas. Sua história se funde com a própria MPB e suas obras são imortais.

3 Obra

Soneto de Fidelidade

De tudo ao meu amor serei atento
Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto
Que mesmo em face do maior encanto
Dele se encante mais meu pensamento.

Quero vivê-lo em cada vão momento
E em seu louvor hei de espalhar meu canto
E rir meu riso e derramar meu pranto
Ao seu pesar ou seu contentamento

E assim, quando mais tarde me procure
Quem sabe a morte, angústia de quem vive
Quem sabe a solidão, fim de quem ama

Eu possa me dizer do amor (que tive):
Que não seja imortal, posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure.

Vinícius de Moraes iniciou sua extensa obra com poesias, poemas e sone-tos. Desde o início já se percebia o culto à imagem da mulher, tendo-a como inspiração absoluta a quem dedicou a maior parte de seu acervo poético. Era um romântico e um sedutor incorrigível, embriagado com sabor carnal de suas musas.
Não se pode ligar a obra de Vinícius a uma determinada época; tudo o que escreveu foi eternizado e considerado atemporal. Quando a Revolução Modernista cassava a composição dos 14 versos, o poetinha escrevia sonetos; por outro lado, fez parte da renovação da MPB com a Bossa Nova.
Em 1927 compôs canções com a parceria dos irmãos Paulo e Haroldo Tapajóz. Em 1933, tem publicado o seu primeiro livro de poemas, O Caminho para a Distância. Entre inúmeras viagens e serviços burocráticos e políticos, continuou a escrever e a debater sobre música, poemas e cinema. Trabalhou também em jornais e revistas.
Escreveu, em 1954, a peça “Orfeu da Conceição” em parceria com Tom Jo-bim, ganhando a Palma de Ouro no Festival de Cannes em 1959 e o Oscar de me-lhor filme estrangeiro, ao ser transformada no filme “Orfeu Negro” por Marcel Camus. Um ponto a ressaltar é que, apesar da autoria de Vinícius, a produção foi francesa, tendo, portanto, a França como vencedora. O filme ganharia uma produção brasileira em 1999, com o título “Orfeu”, dirigida por Cacá Diegues.
Frequentador assíduo do Bar Veloso, em Ipanema, inspirou-se em Helô Pinheiro, que passava sempre em frente ao bar e compôs, em 1962, com a parceria de Tom Jobim, a canção clássica Garota de Ipanema. A musa inspiradora só saberia ser a fonte de inspiração da música 2 anos depois.
Preparava A Arca de Noé 2 com o parceiro e amigo Toquinho, quando fale-ceu; o álbum foi lançado no ano seguinte. Inúmeras coletâneas chegam às lojas até hoje, rememorando e homenageando o poetinha.
3.1 Livros

a) O Caminho para a Distância (1933);
b) Forma e Exegese (1935);
c) Ariana, a Mulher (1936);
d) Novos Poemas (1938);
e) Cinco Elegias (1943);
f) Poemas, Sonetos e Baladas (1946), também conhecido como O Encontro do Cotidiano (1968);
g) Pátria Minha (1949);
h) Antologia Poética (1954);
i) Livro de Sonetos (1957);
j) Novos Poemas (II) (1959);
k) Para Viver um Grande Amor (Crônicas e Poemas) (1962);
l) A Arca de Noé; Poemas Infantis (1970);
m) Poesia Completa e Prosa (1998).

3.2 Teatro

a) As Feras;
b) Cordélia e o Peregrino;
c) Orfeu da Conceição;
d) Procura-se uma Rosa;
e) As Doze Bailarinas;
f) Como Pode ser Bode.

3.3 Discografia

a) Orfeu da Conceição (1956);

b) Vinícius e Odete Lara (1963);

c) De Vinícius e Baden especialmente para Ciro Monteiro (1965);

d) Vinícius e Caymmi no Zum Zum (1965);

e) Os Afro-sambas (1966);

f) Vinícius: Poesia e Canção (ao vivo) (1966);

g) Garota de Ipanema (Trilha sonora do filme) (1967);

h) Vinícius (1967);

i) Vinícius em Portugal (1969);

j) Vinícius de Moraes en "La Fusa" com Maria Creuza e Toquinho (1970)

k) Como Dizia O Poeta (1971);

l) Toquinho e Vinícius (1971);

m) Vinícius + Bethânia + Toquinho - En La Fusa (1971);

n) Marilia / Vinícius (1972);

o) Vinícius canta: Nossa Filha Gabriela (1972);

p) São Demais Os Perigos Dessa Vida (1972);

q) O Bem-Amado (1973);

r) Vinícius & Toquinho

s) Saravá Vinícius! - Vinícius de Moraes en São Paulo con Quarteto em Cy y Toquinho (1974);

t) Vinícius / Toquinho (1974);

u) O Poeta e o Violão (1975);

v) Deus lhe pague (1976);

w) Antologia Poética (1977);

x) Tom, Vinícius, Toquinho e Miúcha - Gravado ao vivo no Canecão (1977);

y) 10 anos de Toquinho e Vinícius (1979);

z) Um pouco de ilusão (1980);

aa) Testamento (1980);

bb) A Arca de Noé (1980);

cc) A Arca de Noé 2 (1981);

dd) Poeta, moça e violão - Vinícius, Clara e Toquinho (1991);

ee) Vinícius & Amigos (2006).

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4 Conclusão

Eu Sei Que Vou Te Amar

Eu sei que vou te amar
Por toda a minha vida eu vou te amar
Em cada despedida eu vou te amar
Desesperadamente, eu sei que vou te amar
E cada verso meu será
Prá te dizer que eu sei que vou te amar
Por toda minha vida
Eu sei que vou chorar
A cada ausência tua eu vou chorar
Mas cada volta tua há de apagar
O que esta ausência tua me causou
Eu sei que vou sofrer a eterna desventura de viver
A espera de viver ao lado teu
Por toda a minha vida

Seria redundante reafirmar a importância de Vinícius de Moraes na cultura brasileira. Historicamente, atravessou o século XX influenciando a música popular brasileira, o cinema, a literatura, o teatro. Entre prosa e verso, seus textos se dividi-ram entre uma parte mais clássica e uma mais popular.
A participação política de Vinícius não pode ser deixada de lado, mesmo que não tenha sido propriamente um homem partidário. Sua passagem na diplomacia e seu contato com Juscelino Kubitschek, sua exoneração durante o golpe de 64, tudo isso teve repercussão na sociedade brasileira.
Amante, romântico, boêmio, poeta... Qualquer que seja o adjetivo dado, não poderá expressar toda a genialidade do poetinha, que encantou multidões e fez de sua arte eterna, ou pelo menos, “que seja infinita enquanto dure...”.



Assinatura do “poetinha”

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